28 junho 2016

Entrevista: João Pinheiro

João Pinheiro, o baterista filósofo. Nestas respostas às perguntas lançadas pelos fãs, ficam a saber que a sala de ensaios é o seu ginásio, a importância do seu irmão em Diabo na Cruz, os bateristas que mais admira, a filosofia da bateria e muito mais.

Qual é a música de Diabo na Cruz mais lixada de tocar, que puxa mais por ti (e pela bateria)?
Talvez a música que puxe mais por mim seja a "Bomba-Canção", por ser rápida e ter um desenho de bateria bastante busy. Mas também posso sentir isto porque não a tocamos em todos os concertos, e por isso está menos oleada que outras. Por outro lado, quando a tocamos, é mais para o final dos concertos, numa altura em que estamos mais cansados. Ainda assim, está no meu top de músicas preferidas de diabo.

Já chegaste a entrar, ou a considerar entrar, para um concerto já sem t-shirt vestida?
Sinceramente não me lembro bem se isso aconteceu, mas é possível ter acontecido num concerto em Lisboa na Praça do Intendente, por causa do calor infernal que estava nessa noite.

Quantas horas por dia passas no ginásio?
Nunca entrei num ginásio a minha vida inteira. Não gosto muito da ideia de ir ao ginásio, mesmo nada aliás. Sempre fiz desporto e ainda faço algum, antigamente era acima de tudo futebol e hoje em dia é mais bicicleta. O meu ginásio é a sala de ensaios! Aí passo bastantes horas por dia!

O berço do Diabo foi na garagem da família Pinheiro. Aquele espírito adolescente de banda de garagem ainda está convosco?
Penso que o espírito adolescente faz parte do Rock e Diabo na Cruz é essencialmente uma banda de rock. E é também uma banda de garagem, foi aí que começámos e sempre que ensaiamos sentimos esse espírito vivo e presente em nós. No entanto, quando a banda começou nós já não éramos adolescentes e portanto conseguimos aliar a esse espírito alguma maturidade e experiência, o que nos permitiu ser mais eficazes em muitas alturas. De qualquer modo, posso dizer que num certo sentido, é esse espírito adolescente da banda de garagem que ainda hoje me move na forma como oiço música e na forma como toco.

Que tal é ter um irmão mais novo [Manuel Pinheiro] na banda? Dás-lhe cabo do juízo? :D
Sempre tive a experiência de tocar com o meu irmão em banda. Ele fez parte da formação dos Tv Rural (a minha primeira banda, que ainda tenho) e foi pela minha mão que entrou para os Diabo. Claro que a relação entre irmãos às vezes é mais intensa, mas com a idade aprende-se a limar arestas. Todos os dias isso tem de ser feito para o bem do equilíbrio do grupo que é o mais importante. Neste momento ele é, como todas as outras pessoas na banda, um elemento indispensável e ajudou muito a desenhar a sonoridade que temos actualmente.

Como é a partida e a chegada de novos membros à banda? Acontece de forma natural ou sentem-se algo renitentes de início e ao longo do tempo passa?
É um processo natural de adaptação. Ao início todos sentimos as diferenças, mas, sempre que isso aconteceu, a renitência da nossa parte foi mínima e por isso o entrosamento de quem entrou foi rápido. E quem entra tem sempre algo de novo a dar à banda, o que também é motivo de entusiasmo para quem está. Por outro lado, depende das circunstâncias em que acontece essa mudança, mas no geral, apesar de nos sentirmos mais seguros quando a formação está estabilizada, há sempre algo de bom que acontece quando se agitam as águas.

Li algures que tinhas estudado Filosofia. A última coisa que nos passa pela cabeça quando te vemos a dar o litro na bateria é que aquele homem se interessa por ideias e conceitos... Porque estudaste Filosofia e porque é que isso te fez falta?
Compreendo essa estranheza, ainda por cima sendo o meu instrumento algo tão físico, mas não são coisas incompatíveis. Há qualquer coisa meio inexplicável que não separou para mim a bateria da filosofia, algo como um pensar do todo que está presente em ambas. Eu nunca deixei de tocar bateria durante todo o curso.
O meu interesse na Filosofia apareceu quase só no 12º ano, muito por causa da professora que tive, mas muito também porque fui surpreendido pela descoberta de uma nova abordagem da realidade e do mundo e por uma forma de pensar mais profunda e atenta a dimensões que eu desconhecia até então.
Quando escolhi a licenciatura em Filosofia fui um pouco atrás desse fascínio recente, mas também fui empurrado pelas boas notas que tive nesse ano. No entanto, houve momentos em que admito ter pensado seriamente em desistir, sobretudo porque me apercebi desde cedo que a música seria o meu caminho. Hoje a minha relação com a filosofia é bastante mais distante.

Quais são os bateristas que mais admiras (em Portugal ou lá fora)?
É impossível não deixar ninguém de fora, quando há tanta gente que me influenciou e influencia. Além do meu pai, que também tocava bateria e teve uma banda, o baterista que me fez querer tocar foi o Dave Grohl. Ele é a energia e a garra supremas, aliadas à técnica e às ideias certas para cada música onde participa. Dessa geração tenho de referir também o Matt Cameron dos Soundgarden. Depois os mais antigos, claramente o John Bonham, o Ginger Baker e o Robert Wyatt. Em Portugal, o Rui Alves é o baterista que mais me fascinou, para além de ser uma das melhores pessoas que conheci. Actualmente penso que temos óptimos bateristas em Portugal. Um dos mais completos e cativantes para mim é o João Correia. Mas gosto muito da energia do Hélio Morais ao vivo, da eficácia do Fred Pinto Ferreira e do talento do David Pires. Entre muitos, muitos outros!

Já partiste muitas baquetas em concertos de Diabo na Cruz? O público pede-te muitas vezes para ofereceres as baquetas?
Às vezes ficam meio lascadas ou até rachadas, mas partir mesmo só parti duas ou três vezes. Sim, o público pede-me baquetas em quase todos os concertos, já me aconteceu mais do que uma vez até, receber mensagens com meses de antecedência a pedir baquetas. Tento dar o mais que posso, às vezes não consigo.

Tendo em conta que estás na banda desde o início, qual é a música que mais gostas de tocar? Há alguma da qual já estejas farto?
Neste momento a música que eu mais gosto de tocar é o "Mó de Cima", do último disco. Farto propriamente não me sinto em relação a nenhuma música do nosso concerto, mas às vezes as mais antigas não são as que mais apetece tocar. Faz parte...

Uma vez que bates todos os recordes de projectos paralelos, alguma vez receias não conseguir dar o teu máximo por te desmembrares em tantas bandas?
Obviamente faço tudo para que isso não aconteça, mas admito que conciliar agendas e interesses às vezes tão distintos, pode tornar-se uma dor de cabeça. A verdade é que, mesmo sendo Diabo na Cruz a minha banda principal, é-me muito difícil imaginar-me a tocar numa só banda e a canalizar num só sentido aquilo que tenho para dar. Tento dar tudo o que tenho a cada banda onde estou envolvido e quando percebo que estou a perder esse comboio, e as pessoas à minha volta podem sair prejudicadas com isso, tenho de tomar decisões…

Ter tantas bandas e tocar com diferentes músicos faz de ti um músico melhor? De que forma?
Estou certo que faz de qualquer pessoa um músico melhor. Lidar com formas diferentes de encarar a música, com processos e estilos musicais distintos, com formações de banda diferentes, desenvolve a capacidade de trabalho em grupo, a própria técnica do instrumento e aumenta o leque de soluções para utilizar em cada canção. E principalmente, cada músico individualmente é uma fonte de inspiração e influência para mim, cada um tem sempre alguma coisa nova e única para dar, por isso, com quantos mais e melhores músicos eu puder trabalhar, melhor!

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3 comentários:

Miguel disse...

É um dos melhores bateristas da nossa praça. É só vê-lo a tocar para perceber isso.

Susana Campino disse...

É uma máquina, sem igual na praça!! :)

Jorge Pinheiro disse...

Olha se eu não tivesse a bateria cá em casa...